Semi-laico?
Ainda não percebi se o Estado português é laico ou não. Não é que isso me dê muita preocupação, mas agora que querem proibir a atribuição de nomes de santos aos estabelecimentos de ensino, gostava de saber se é por causa desse pormenor ou se é por pura borreguice socialista.
A História de Portugal, como território europeu e como nação independente, está inserida num contexto cultural muito mais alargado que é o de toda uma Europa cristã, assim tornada após a saída dos árabes da Península Ibérica, com a conquista do Reino de Granada, em 1492. Até aqui, não dei novidades a ninguém. A religião cristã e, no caso da Europa ocidental, a religião Católica, esteve sempre na base da maioria das decisões políticas dos vários estados europeus que viam o rei como o detentor do poder que lhe fora atribuído por Deus. Logo, também por cá fomos culturalmente formatados por governantes assim iluminados que foram mandando umas bocas por aqui e por ali, segurando a espada com a mão direita e a Bíblia Sagrada com a esquerda, desbravando, matando, proibindo, permitindo, justificando, por vezes, com a fé o que era injustificável… Vamos agora ficar amuados com o D. Afonso Henriques, porque ele escreveu ao Papa Inocêncio II a prestar-lhe vassalagem e a pedir o reconhecimento formal do Condado Portucalense? Ah, o maroto do menino Afonso que começou mal esta coisinha chamada Portugal… Vamos ignorar que somos país, porque um Papa assim o reconheceu? Respondam vocês.
O nosso Estado nunca teve, portanto, uma origem laica. E, mesmo depois do 25 de Abril, e acalmados os ânimos anticlericais que grassaram estupidamente por essa altura, o Estado esteve sempre ligado à Igreja de Roma, porque uma tradição de 800 anos não se quebra com meia-dúzia de revoluções, uma com cravos outras sem.
Abaixo os Santos? Os Pintos? Os Sousas? Os Pinto de Sousa?
Será que os governantes de hoje não reconhecem a importância da Igreja Católica como colaboradora activa na estruturação das mentalidades do pessoal cá deste triste burgo? Custo a acreditar. Por isso, quando me dizem que o Governo português quer acabar com a atribuição de nomes de santos a escolas, recusei aceitar tal ideia estapafúrdia. No entanto, eles tem de se entreter com alguma coisa, nem que seja a escrever leis sem sentido.
Nesse caso, que sejam coerentes. Se não há nomes de santos para as escolas, também não o haverá para coisa nenhuma: nem para freguesias, nem para hospitais, nem para ruas, nem para largos, o que se revela como um perfeito atentado à Cultura do país, para além de um certo estreitamento intelectual. E, para serem definitivamente consentâneos e rigorosos, vão decerto cancelar os feriados que a Igreja Católica nos oferece: dia da Santa Mãe de Deus (1 de Janeiro), a Sexta-Feira da Paixão, o dia do Corpo de Deus, o dia da Assunção de Nossa Senhora (15 de Agosto), o dia de Todos os Santos (1 de Novembro), o dia da Imaculada Conceição, coroada Padroeira de Portugal por D. João IV (8 de Dezembro), e o dia de Natal.
Mais ainda: lá teremos de, por decreto governamental, rasgar todos os manuais de História, teses, artigos e estudos sobre Portugal, os portugueses, os Descobrimentos, a Evangelização. Vamos fingir que não existiram figuras como o padre António Vieira, São João de Deus, Santo António de Lisboa, a Rainha Santa Isabel ou D. Sebastião. Vão começar a figurar nos livros de História e nos compêndios de Literatura como o Vieirinha Pregador, o Joca Montemorense, o Tony Alfacinha, a tia Bé e o tio Bábá. Porque tudo não passou de um engano com séculos de duração. Santos? Mártires? Ná! Tudo um lapso! Tudo um embuste.
12 de Março de 2005
Não se pretende com este alinhavar de pensamentos ajuizar do peso positivo ou negativo destas nossas origens culturais e da influência da religião Católica em muitas das atitudes políticas dos nossos reis e de alguns presidentes. Isso ficará para depois. O que não consigo aceitar é que um Estado que se proclama laico, isto é, sem religião oficial, queira obrigar os cidadãos do seu país a negar séculos de História e de Cultura e a recusar-lhes o direito de dar largas à sua liberdade, inclusivamente à religiosa.
Depois de alguma reflexão, só me resta concluir, lamentavelmente, que a História de Portugal começou no dia 12 de Março de 2005, quando o actual governo tomou posse no palácio da Ajuda. Antes disso, tudo não passou de um conto de fadas.
Hipocrisia
Que contradição é esta que, num estado laico e socialista, permite que se continue a transmitir Missa de Domingo no canal estatal, ao mesmo tempo que se quer retirar das salas de aulas os crucifixos e suprimir do protocolo de Estado a presença dos representantes eclesiásticos? (Por que não alargar essa representação a outras igrejas e confissões?)
Um aluno meu que leve um crucifixo no fio, um quipá judaico na cabeça ou um véu muçulmano no rosto não aprende nem mais nem menos Inglês por causa disso. E tem todo o direito de manifestar os valores da sua fé. E não deve ter vergonha dos princípios em que acredita ou em que acreditam os seus pais ou o seu povo. O nosso problema e o problema do Estado, que nos tenta à viva força transformar em proletários marxistas, sem vontade própria, foi termos vivido durante largos anos aparentemente felizes e profundamente cinzentos sem a possibilidade de convivermos dentro de portas com pessoas diferentes, o que facilitou a caracterização imbecil que faziam de nós: um povo de brandos costumes. Hoje, tal como ontem, há o medo da diferença. E isso é sintoma de racismo e xenofobia por omissão, com um aroma a estalinismo mal disfarçado.
É preciso desviar outro Santa Maria, é preciso outro General Sem Medo vir receber um ramo de flores no Largo da minha cidade que tem o seu nome, é urgente outro 25 de Abril, agora feito com mais cuidado e sem maluquices de maior, é preciso um sinal que abane os surdos e os cegos que muitos colocaram a governar este acampamento.
O Estado precisa, pois, de ser reformado. Aproveitem, agora que andam com esta ciguêra de reformar tudo.
Ainda não percebi se o Estado português é laico ou não. Não é que isso me dê muita preocupação, mas agora que querem proibir a atribuição de nomes de santos aos estabelecimentos de ensino, gostava de saber se é por causa desse pormenor ou se é por pura borreguice socialista.
A História de Portugal, como território europeu e como nação independente, está inserida num contexto cultural muito mais alargado que é o de toda uma Europa cristã, assim tornada após a saída dos árabes da Península Ibérica, com a conquista do Reino de Granada, em 1492. Até aqui, não dei novidades a ninguém. A religião cristã e, no caso da Europa ocidental, a religião Católica, esteve sempre na base da maioria das decisões políticas dos vários estados europeus que viam o rei como o detentor do poder que lhe fora atribuído por Deus. Logo, também por cá fomos culturalmente formatados por governantes assim iluminados que foram mandando umas bocas por aqui e por ali, segurando a espada com a mão direita e a Bíblia Sagrada com a esquerda, desbravando, matando, proibindo, permitindo, justificando, por vezes, com a fé o que era injustificável… Vamos agora ficar amuados com o D. Afonso Henriques, porque ele escreveu ao Papa Inocêncio II a prestar-lhe vassalagem e a pedir o reconhecimento formal do Condado Portucalense? Ah, o maroto do menino Afonso que começou mal esta coisinha chamada Portugal… Vamos ignorar que somos país, porque um Papa assim o reconheceu? Respondam vocês.
O nosso Estado nunca teve, portanto, uma origem laica. E, mesmo depois do 25 de Abril, e acalmados os ânimos anticlericais que grassaram estupidamente por essa altura, o Estado esteve sempre ligado à Igreja de Roma, porque uma tradição de 800 anos não se quebra com meia-dúzia de revoluções, uma com cravos outras sem.
Abaixo os Santos? Os Pintos? Os Sousas? Os Pinto de Sousa?
Será que os governantes de hoje não reconhecem a importância da Igreja Católica como colaboradora activa na estruturação das mentalidades do pessoal cá deste triste burgo? Custo a acreditar. Por isso, quando me dizem que o Governo português quer acabar com a atribuição de nomes de santos a escolas, recusei aceitar tal ideia estapafúrdia. No entanto, eles tem de se entreter com alguma coisa, nem que seja a escrever leis sem sentido.
Nesse caso, que sejam coerentes. Se não há nomes de santos para as escolas, também não o haverá para coisa nenhuma: nem para freguesias, nem para hospitais, nem para ruas, nem para largos, o que se revela como um perfeito atentado à Cultura do país, para além de um certo estreitamento intelectual. E, para serem definitivamente consentâneos e rigorosos, vão decerto cancelar os feriados que a Igreja Católica nos oferece: dia da Santa Mãe de Deus (1 de Janeiro), a Sexta-Feira da Paixão, o dia do Corpo de Deus, o dia da Assunção de Nossa Senhora (15 de Agosto), o dia de Todos os Santos (1 de Novembro), o dia da Imaculada Conceição, coroada Padroeira de Portugal por D. João IV (8 de Dezembro), e o dia de Natal.
Mais ainda: lá teremos de, por decreto governamental, rasgar todos os manuais de História, teses, artigos e estudos sobre Portugal, os portugueses, os Descobrimentos, a Evangelização. Vamos fingir que não existiram figuras como o padre António Vieira, São João de Deus, Santo António de Lisboa, a Rainha Santa Isabel ou D. Sebastião. Vão começar a figurar nos livros de História e nos compêndios de Literatura como o Vieirinha Pregador, o Joca Montemorense, o Tony Alfacinha, a tia Bé e o tio Bábá. Porque tudo não passou de um engano com séculos de duração. Santos? Mártires? Ná! Tudo um lapso! Tudo um embuste.
12 de Março de 2005
Não se pretende com este alinhavar de pensamentos ajuizar do peso positivo ou negativo destas nossas origens culturais e da influência da religião Católica em muitas das atitudes políticas dos nossos reis e de alguns presidentes. Isso ficará para depois. O que não consigo aceitar é que um Estado que se proclama laico, isto é, sem religião oficial, queira obrigar os cidadãos do seu país a negar séculos de História e de Cultura e a recusar-lhes o direito de dar largas à sua liberdade, inclusivamente à religiosa.
Depois de alguma reflexão, só me resta concluir, lamentavelmente, que a História de Portugal começou no dia 12 de Março de 2005, quando o actual governo tomou posse no palácio da Ajuda. Antes disso, tudo não passou de um conto de fadas.
Hipocrisia
Que contradição é esta que, num estado laico e socialista, permite que se continue a transmitir Missa de Domingo no canal estatal, ao mesmo tempo que se quer retirar das salas de aulas os crucifixos e suprimir do protocolo de Estado a presença dos representantes eclesiásticos? (Por que não alargar essa representação a outras igrejas e confissões?)
Um aluno meu que leve um crucifixo no fio, um quipá judaico na cabeça ou um véu muçulmano no rosto não aprende nem mais nem menos Inglês por causa disso. E tem todo o direito de manifestar os valores da sua fé. E não deve ter vergonha dos princípios em que acredita ou em que acreditam os seus pais ou o seu povo. O nosso problema e o problema do Estado, que nos tenta à viva força transformar em proletários marxistas, sem vontade própria, foi termos vivido durante largos anos aparentemente felizes e profundamente cinzentos sem a possibilidade de convivermos dentro de portas com pessoas diferentes, o que facilitou a caracterização imbecil que faziam de nós: um povo de brandos costumes. Hoje, tal como ontem, há o medo da diferença. E isso é sintoma de racismo e xenofobia por omissão, com um aroma a estalinismo mal disfarçado.
É preciso desviar outro Santa Maria, é preciso outro General Sem Medo vir receber um ramo de flores no Largo da minha cidade que tem o seu nome, é urgente outro 25 de Abril, agora feito com mais cuidado e sem maluquices de maior, é preciso um sinal que abane os surdos e os cegos que muitos colocaram a governar este acampamento.
O Estado precisa, pois, de ser reformado. Aproveitem, agora que andam com esta ciguêra de reformar tudo.
Afinal de contas…
…Por que motivos o Governo não recebeu em pé de igualdade Sua Santidade o Papa, Sumo Pontífice da Igreja Católica, e Sua Santidade o Dalai Lama, do Tibete? Teve medo da Vingança do Chinês?
…Como é que se aceita que o ex-governante António Guterres, laico e socialista como o padrinho Mário Soares, tivesse como confessor o Padre Vítor Melícias? Mas que raio de laicismo é este? Há, porventura, um estatuto que permite esta mistela de socialista laico católico praticante? Ou sou eu que já não estou a bater bem?
2 comentários:
Durante uns tempos pensei que uma sociedade Laika era uma data de gente que tinha a mania de ir dar passeatas em foguetões soviéticos.
Depois aprendi umas coisas e vi que não era bem isso...
Mesmo assim, confesso que prefiro a liberdade das pessoas, incluindo a religiosa, a uma coisa que não conseguiu melhor que ter um nome de cadela, mesmo sendo o de uma cadela famosa.
A minha dita cuja chama-se Laika, mas nem por isso tomou os ares importantes de alguns laikos da nossa praça.
Um abraço e volte sempre.
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