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1/ Este é o terceiro livro de contos. Pode dizer-se que é de facto o género literário preferido de João Luís Nabo? Porquê?
É, de facto, o meu género narrativo preferido. O conto pressupõe a utilização de uma dinâmica diferente no contar da história e, também, uma capacidade de economia narrativa. Digamos que a técnica de utilização da “quadratura” espaço/tempo/personagens/narrador é a que tenho treinado mais e que, por isso, utilizo mais. Sou, digamos, um curioso da escrita (escritores são o Saramago e o Lobo Antunes) de fôlego reduzido, mas que tenta utilizar essa característica da melhor forma. O Lago e O País do Esquecimento, duas pequenas novelas publicadas num só volume em 2005, vêm contrariar esta prática, porque são de uma extensão um pouco mais alargada. No entanto, são os contos que me fazem sentir mais confortável como contador de estórias.
2/Vila Nova é o centro da sua escrita. É um tributo que presta à cidade e suas gentes ou é porque estes contos partem sempre de episódios reais acontecidos em Montemor-o-Novo?
Vila Nova é, sem dúvida, (para quê negá-lo?), o nome ficcional da minha terra – Montemor-o-Novo – onde se passam aventuras simples, algumas estranhas, mas todas elas protagonizadas por personagens típicas, ligadas à povoação, com comportamentos característicos dos habitantes das vilas e aldeias do interior alentejano. Muitos leitores perguntam-me se eu passo para o papel histórias que me contam. Essa situação apenas aconteceu duas vezes: no conto “A Aposta”, que está na colectânea Alentejo Sem Fim (2004) e no conto “O Sinal”, publicado agora. Este último é uma história sobre a prisão do lutador antifascista montemorense João do Machado, um episódio que o próprio me contou há uns anos e que eu, com a sua autorização, ficcionei. Todas as outras narrativas são meras construções ficcionais sem qualquer ligação com acontecimentos reais.
No entanto, este livro tem algumas histórias de carácter muito pessoal, cujos protagonistas são precisamente membros da minha família – os meus filhos, a minha mulher e a minha mãe – o que não deixa de ser também um género um pouco “anfíbio”, uma mescla entre a autobiografia, as memórias e a ficção. Mas os leitores irão reparar que este terceiro livro é o mais “pessoal” e o mais introspectivo dos três, para além de ser dedicado ao meu pai que, neste momento concreto, merece todas as dedicatórias do mundo.
3/ A editora falou num possível romance. Para quando um romance de grande fôlego envolvendo a cidade?
Como referi anteriormente, sinto-me mais confortável na escrita de contos. Contudo, o romance é um objectivo que não se põe de parte. Há alguns projectos nesse sentido. Tenho um romance começado há uns anos, interrompido porque me apeteceu escrever contos (são mais práticos) e que aguarda agora novas investidas da minha parte. Como me escreveu uma amiga, terá de ser quando eu encontrar a altura certa. Mas a publicação de uma obra dessa envergadura não depende só de quem a escreve. Falo dos apoios que são fundamentais para levarmos adiante esse desiderato. Por exemplo, a Câmara Municipal de Montemor tem manifestado sempre uma enorme disponibilidade para apoiar a edição de todos os meus livros. Essa atitude, na minha opinião decisiva na concretização desses projectos, dá-me alguma segurança (a mim e à Editorial Tágide) para pensarmos seriamente no assunto. Devo assinalar também, desta vez, o apoio da Direcção Regional da Cultura do Alentejo, que muito nos honrou.
4/ Durante a apresentação do livro disse, cito, que “escrever ficção é sempre uma resposta ao caos que nos rodeia”. Para o João Luís a escrita é o tal ponto de equilíbrio num quotidiano muitas vezes absurdo?
A escrita, e a escrita de coisas inventadas, de ficção, portanto, é uma das formas de fugir ao real, mas com o objectivo de mostrar esse real sob um olhar crítico. Como refere Ítalo Calvino num dos seus ensaios, o acto da escrita parte sempre de um cenário de caos (são milhares as informações misturadas que temos ao nosso dispor para inserir nos contos) para, a partir daí, procedermos à organização dessa desordem, “limparmos” o que não faz falta, até termos a história que queremos que os outros leiam. Uma narrativa ficcional – conto, novela ou romance – é, assim, como se fosse um bloco de pedra que o escultor vai esculpindo, retirando tudo o que está a mais, eliminando todo e qualquer “ruído”, até ao aparecimento do objecto desejado, símbolo desse equilíbrio que se procura e não se encontra na vida de todos os dias. Só que, em vez de pedra, temos as palavras, mil vezes mais complexas, polissémicas e… terrivelmente fugidias.
5/ Segundo uma das responsáveis pela Editorial Tágide, uma das características dos seus contos, com muita acção e diálogos, é serem facilmente transponíveis para o teatro. Foi pensado?
Sou da área das literaturas. Logo, as minhas leituras passam pelos géneros literários todos: o narrativo, o lírico e o dramático. Por isso, é bem possível que na minha escrita haja a fusão dos três, de forma até inconsciente e que se manifesta nos meus textos, tal como foi referido na sessão. Curiosamente, “O Funeral da Dona Capitolina”, um dos contos do meu primeiro livro, foi encenado por alunos e professores da escola secundária onde trabalho e penso que resultou muito bem. Por isso, a Celina Veiga de Oliveira é capaz de ter razão. Mas quando estou a escrever não penso muito nessa questão. Nem muito nem pouco. Não penso, simplesmente.
6/Foi uma apresentação à qual compareceu imensa gente. Surpreendeu-o? Vê isso como a sua consagração como escritor ou as pessoas interessam-se mais quando se fala do seu espaço, da sua terra?
Consagração? Escritor? Não, claro que não. Na apresentação dos outros dois livros, a sala também esteve cheia. Por isso, o que senti foi, tão somente, um prazer imenso ao ver tanta gente que se deslocou à Biblioteca Municipal para ouvir e para ler o que escrevi desta vez. Percebi que continuo a ter muitos amigos que querem manifestar os seus afectos e a sua amizade estando presentes (quer chova, quer faça Sol) nos eventos onde estou envolvido. Senti que as pessoas vêem nos meus textos e na sua leitura uma forma de manifestarem também a sua paixão incondicional por Montemor, alguns, até, sem serem naturais da nossa cidade. Como professor que escreve contos, o que me deixa feliz é a vontade que as pessoas manifestam na leitura. E, sobretudo, quando alunos meus me dizem que andam a ler contos da minha autoria e me pedem pra autografar os livros que compraram. Isso é uma sensação indescritível. E ler é bom. Nem que seja uma história imaginária passada na terra onde nascemos, escrita por alguém com quem nos cruzamos na escola, na mercearia ou no mercado ou com quem tomamos um café às sextas-feiras de manhã.
2 comentários:
Nem mais. Como dizia alguém que eu conheço "é meu amigo e pronto".
Grande abraço, professor, maestro, amigo e, mais recentemente, conselheiro e orientador de estudo.
quem fala assim... não é como eu! :)))))
beijocassssss
vovómaria
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