A estética
Sessenta e um anos
a beber Montemor todos os dias não são meia-dúzia de meses (e já foram muitos,
que o digam os comerciantes e habitantes da Rua de Aviz) que os técnicos
responsáveis pelas alterações na cidade levaram a concretizar os seus
projectos. Sessenta e um anos de Montemor dão-me a legitimidade de dizer, em
qualquer lugar e a quem quer que seja, que não gosto do que fizeram à minha
cidade e que, por isso mesmo, os gostos discutem-se sim, senhor. Que raio de
bancos são aqueles que espalharam pelas ruas e largos emblemáticos de Montemor?
Que floreiras horríveis são aquelas que semearam a eito Rua de Aviz afora? Que
lajes de cimento são aquelas, todas tortas e que ficam encardidas assim que
passa um caracol, e que nada, sublinho o NADA,
têm a ver com Montemor e o Alentejo, onde esta terrinha se situa?
Digam-me, por favor, qual é o sentido estético que deram ao novo Largo da Câmara?
Aquele é o Largo da Câmara de que cidade, de que vila? E o Largo de São João de
Deus? Porquê aqueles desníveis à volta da estátua? Por ser moderno? Porque se
faz noutras cidades do Norte ou do Sul? Eu estou-me a marimbar para as cidades
e para os técnicos e para os arquitectos e engenheiros das cidades do Norte ou
do Sul. Eu queria era que os técnicos que trabalham na e para a minha cidade
tivessem tido em conta o nosso passado, o nosso presente e a traça tradicional
de cada praça, de cada rua. Isso é que eu queria. O meu desgosto, a minha
desilusão é para com estes que não tiveram em conta a nossa história e,
sobretudo, a vida, a longa vida, de quem cá vive e tem de levar todos os dias
com aquelas coisas estranhas que se chamam floreiras e bancos e cenas e tal que
só empatam… a vista e a sensibilidade.
“E o Jardim
Público?” perguntarão. Bom, é como dizia o outro: primeiro, estranha-se e
depois entranha-se. Mas em relação ao Jardim, do mal o menos. Ficou mais aberto
e mais disponível para a cidade. Só não faz é pandã com o muro do Jardim dos
Cavalinhos, nem com o muro da Carlista, nem com os gradeamentos da Pedrista, o
que até pode ser uma nova ameaça para aquela zona… Eu nem quero pensar!
Sei que a responsabilidade
por estes gostos e por estas opções estéticas não são do actual executivo, mas
sei que os responsáveis por tais avarias deveriam reflectir no que fizeram para
não o repetirem noutra cidade qualquer. E não. Não estou contra os comunistas,
nem contra os pêessedês, nem contra os pans, nem contra os bloquistas, nem
contra os chegas, nem contra os socialistas, nem contra os cdesses. Estou
apenas contra o mau gosto que começou a reinar na minha cidade. E é por isso
que não me calo. Ou então, admitam esse erro estético colossal e, aí,
calar-me-ei para sempre.
II
A ética
O nosso recém-eleito
primeiro-ministro não quer falar com o Chega. Está mal. Será este um dos
primeiros sinais da ditadura socialista que para aí vem? Ou é apenas uma birra
do António só porque o André lhe disse que ia atrás dele? Birras de gaiatos tratam-se
com um pequeno açoite e, sim, o Costa devia receber o Chega tal como recebe todos
os outros partidos. Depois, o que lhe dirá, isso é lá com ele, mas a sua recusa
em receber um partido com assento parlamentar fica-lhe mal e assusta-me. Não
sei se o Chega lhe faria o mesmo se fosse eleito. Talvez sim, talvez não.
Jamais o saberemos, de facto. Mas o Costa devia ser o primeiro a dar exemplo de
lisura, educação e democracia. Se eu tiver ideias completamente opostas às de
Costa também ficarei posto de parte? Nunca o saberemos, porque eu não sou
político.
Se eu gosto do
Chega? Não sou obrigado a gostar de todos os partidos do espectro político,
muito menos daqueles que não me dão confiança numa democracia aberta e
pluralista. Mas que André Ventura deveria ser recebido pelo primeiro-ministro,
disso não tenho dúvida.
III
Os anni horribiles do ensino
Passámos
praticamente dois anos com aulas “à distância”. Primeiro, foi aprender
teoricamente como é que tudo funcionava, com tutoriais e cenas no Youtube e
assim, que não me chegaram a ensinar a ponta de um corninho. Depois, foi a aprendizagem
na prática, a chatear os amigos que, mais do que amigos, pacientes e
talentosos, conseguiram com que eu dominasse mais ou menos o esquema para poder
dar as minhas “aulas”. Escrevi “aulas”, com aspas, porque o que fiz através do
computador e da tristemente célebre (na minha opinião) Plataforma Teams não
foram aulas. Foram qualquer coisa parecida com uma entretenga televisiva, assim
tipo programa do Marco Paulo, para que as matérias não se fossem perdendo totalmente
e para que os alunos, entre umas mensagens e outras, entre uns jogos e outros
no telemóvel, com os amigos do costume, fossem adquirindo os conhecimentos
minimíssimos para que eu os pudesse passar de ano.
Tudo isto foi uma
afronta para quem é professor a sério. E não me venham os professores excelentes
e iluminados (há muitos por aí) dizer que as aulas online foram o supra-sumo
da pedagogia, porque não foram. (E eles também sabem que não foram). Foram, sem
sombra de dúvida, uma verdadeira perda de tempo. Para não falar no fosso
profundo que se cavou entre quem tinha possibilidades e skills digitais
e entre quem morava em zonas da cidade ou no meio do campo, sem acesso à Internet
e, consequentemente, sem acesso a qualquer contacto com a escola. Que o digam
os pais, os alunos e… os professores.
Eu sei dar aulas
(acho que sei), mas é numa sala de aula, com um quadro e com um pau de giz à
minha disposição. Com livros, cadernos, filmes e outros recursos digitais, e
cérebros a seguirem o que eu lhes ensino, sem distracções nem modernices de
maior, sem a mãe a vir entregar o lanche às quatro em ponto, ou sem a avó a
precisar de ajuda para fazer o chá.
Durante a Pandemia, pouco se aprendeu. Aprendi, sim, que nada substitui a sala de aula e o mar de cabeças à espera de qualquer coisa útil que possa partir de quem está à sua frente.
Pronto, este mês foi assim. Para o próximo… logo se vê.
In "O Montemorense", Fevereiro de 2022
João Luís Nabo