O actual sistema de ensino tem tentado levar alunos de 16 e 17
anos a ler alguns autores-chave da literatura portuguesa: Camões,
Vieira, Garrett, Camilo, Pessoa, Eça, Saramago, Sttau Monteiro. O
actual sistema de ensino quer que os alunos explorem as obras e os
autores, de modo a ficarem preparados para os exames finais, onde os
examinandos deverão espremer, em duas horas de intenso stress,
o que conseguiram aprender desses escritores e das narrativas que os
tornaram célebres.
O actual sistema de ensino não pode querer uma coisa impossível de
querer. Para atingir esse desiderato da tutela, os alunos deveriam
ser possuidores de profundos conhecimentos sobre a História, a
Cultura (erudita e popular) a Política e a Religião do seu próprio
país, porque foi este país que deu aos escritores em estudo o
repositório de onde estes retiraram a matéria dos seus sonhos,
para, depois, atirarem para o papel as suas melhores “invenções”.
E os alunos, pelo menos a grande maioria, reconhecem que lhes falta
uma base cultural consistente para poderem dominar parte dos
conceitos, das temáticas e de um sem-número de referências
históricas explícitas, e não menos vezes implícitas, nos
romances, nas peças de teatro e na poética desses porta-vozes da
nossa vida e do nosso pensamento colectivo. Os estudantes do ensino
secundário não devem olhar para um Eça, para um Pessoa ou para um
Saramago como indivíduos distantes, estrangeiros e que só estão
ali para lhes causar dores de cabeça. A eles e aos professores. Não.
Esses e outros autores são tão portugueses como qualquer de nós e
viveram no mesmo país que hoje procura, a todo o custo, conquistar
uma nova perspectiva do Homem e do Mundo.
Assim, possuindo eles essas “ferramentas” estruturais, fortes e
benfazejas, iriam tirar muito mais proveito das leituras que fazem,
ou que fingem que fazem, e o próprio gesto de ler tornava-se, ele
próprio, agora numa perspectiva de verdadeiros leitores com
conhecimentos e pensamento crítico, num prazer maior, de verdadeiro
diálogo transtemporal entre o aluno e o escritor.
E depois, não é só o Papa Francisco, o Salvador e o Éder que
fazem vibrar multidões. Todos os autores dos programas de Português
do Ensino Secundário foram uma pedra no sapato de alguém, uma
pedrada no charco lamacento do sistema, seres humanos muito à frente
do seu tempo.
João Luís Nabo, in "O Montemorense", Maio de 2017