Há
temas incontornáveis. Os dos
refugiados de guerra domina a actualidade e o pensamento dos cidadãos
de toda a Europa. Os portugueses não serão excepção e
encontram-se divididos em dois grupos distintos que, dificilmente,
encontrarão consenso. De um lado, os que defendem o apoio
humanitário aos que fogem da guerra, da fome, da tortura e que
procuram na Europa uma vida estável e digna. Do outro, os que
gostariam, antes de mais, de ver apoiados os portugueses que ficaram
sem emprego, os que têm fome, os doentes, os maltratados pelo nosso
sistema político e financeiro, os que perderam a casa, a família e
que dormem nas ruas, sem saberem como vai ser o dia de amanhã.
Julgo que ambas as perspectivas têm razão de
ser. A ajuda aos protagonistas da maior crise humanitária desde a
Segunda Guerra, na lista de prioridades do governo português, tem em
conta a necessidade urgente de protecção e de integração dos que
procuram asilo. E essa integração não terá, naturalmente, só a
ver com um abraço amigo de conforto. Há que criar alojamentos,
postos de trabalho, espaço nas escolas para as crianças, espaço
nas comunidades para as famílias. Portugal foi sempre um país
hospitaleiro, talvez por ser uma nação de onde partiram, e
continuam a partir, emigrantes sem alternativa a não ser procurar
melhores dias noutros países. E é este o ponto de colisão entre as
duas posições. Se há gente a partir por não haver empregos, como
poderão os refugiados ser integrados no mercado de trabalho? Se vão
ser dados alojamento a diversas famílias prestes a chegar a Portugal
(casa, água, luz, gás...) por que não fazer o mesmo às centenas
de famílias que, sem emprego, vivem no limiar da pobreza, num
desespero permanente e sem perspectivas de futuro? Se vai haver
dinheiro para ajudar as crianças e os jovens em idade escolar, por
que não se dá um maior apoio às famílias carenciadas que não têm
dinheiro para comprar um lápis ou uma caneta? Por que não alargar o
âmbito de apoio nas escolas e outras instituições a todas as
crianças portadoras de deficiência?
O
ideal seria dar cobertura a todas as situações: às nossas e às
dos outros. E sei que, se a vontade política fosse outra, era isso
que acontecia. Mas a questão está longe de ficar arrumada. Vamos,
em breve, ser postos à prova sobre alguns dos nossos sentimentos
mais escondidos. E vamos ficar a conhecer melhor de que ser humano é
que somos feitos.
In "O Montemorense", Setembro de 2015