terça-feira, 24 de junho de 2014

A Eurodisney


 
 
Ah, futebol, e tal, Campeonato do Mundo, Ronaldo, o maior, e tal, e está lesionado, e já não está lesionado, e vamos ganhar aquilo tudo e má-na-sê-quê. Os noticiários abrem todos a falar da mesma coisa com um entusiasmo tal que até parece que Cristo desceu à terra. Sei que a maioria dos portugueses, meus compatriotas e tão patriotas como eu, querem é pagode e vitórias e grandes jogos, com fintas a sério, defesas monumentais, remates irrepetíveis e grandes penalidades a nosso favor, nem que para isso se parta o perónio a um jogador luso. Acho lindo este sentimento de união. Acho fofo tantos abracinhos, tantos gritinhos, tantos cachecolinhos com as cores da nação, tantas pinturinhas na fronha com as quinas de Portugal.

No entanto, para que esse entusiasmo fosse legítimo, para que essa alegria se tornasse num hino de esperança e de glória, qual festim a comemorar a chegada de D. Álvares Cabral ao Brasil, a equipa de Portugal, formada, dizem os entendidos, pelos melhores jogadores do país, deviam jogar futebol a sério e preocupar-se menos com a imagem, com as selfies, com o penteado, com a cueca da moda, a conta num banco não sei quantos, assim tipo ronaldices e meireldices. Não queremos modelos de passerelle. Queremos profissionais que justifiquem os milhões que ganham por mês, e que são uma afronta a qualquer português, que, honesta e abnegadamente, tenta pôr o quotidiano pão na mesa onde come com a mulher e os filhos. Por isso, não me venham com tretas. Mas ganho o mesmo com este pedido. Já sei que, se perdermos os jogos, vai ser por causa do clima, por causa do árbitro, por causa do penteado do Paulo Bento, por causa das boazonas que circulam por ali e que distraem os másculos e muito homens jogadores da nossa querida selecção.

Portanto, meus amigos: tenham vergonha e joguem. É só isso que têm de fazer. Se não são capazes… então ponham os fatinhos Armani e os pitons xpto nas valises Louis Vuitton e voltem para Portugal. Há sempre uma ou outra vaga na construção civil que vos pode vir a dar jeito.

Ir ao Mundial não é, repito, não é a mesma coisa do que ir à Eurodisney!  Deixem de ser um bluff nacional. Já temos que chegue.


In "O Montemorense", de 20 de Junho de 2014
 

quarta-feira, 18 de junho de 2014

Dino, Paulo e... teatro do bom



Ah, teatro, e tal, Montemor tem tradição, e tal, e o Theatron é já um ponto de referência a nível nacional… Pois é mesmo. E, se ainda não o fosse, passava a sê-lo depois da sua última produção “O Coração de um Pugilista” do dramaturgo alemão Lutz Hubner, nascido em 1964.

Escrever sobre as capacidades camaleónicas de Bernardino Samina, o pugilista, é chover no molhado, porque ele consegue ser sempre cada personagem que interpreta. Assenta-lhe na perfeição a pele do velho pugilista reformado, saudoso dos tempos áureos da sua carreira e que conhece, por acaso do destino, um jovem “delinquente” a cumprir, por determinação do tribunal, um período de serviço social no Lar onde aquele vive, só e em delírio com as suas memórias.

O papel do protagonista acaba por viver, de forma indelével, da extraordinária contracena com um jovem actor, sobre quem já escrevi e de quem também sou amigo. O Paulo Quedas, que interpreta o jovem a cumprir o serviço social, cria, neste diálogo (a peça é um “simples” diálogo entre duas pessoas de gerações diferentes), uma personagem notável, sensível, rebelde, descontraída mas consciente do mundo que o rodeia e ameaça. Posso dizer que não poderia ter sido escolhido o par de actores mais adequado para a representação deste drama actual, com constantes alusões à solidão, ao desinteresse dos jovens pelos mais velhos, mas que também é um hino à esperança e à vida. Tanto um como outro são perfeitamente enquadráveis nas galerias das grandes personagens do novo teatro alemão.

Passámos ali por uma hora de aprendizagem. As personagens aprendem que, embora “retidas” pelos seus “crimes”, podem criar laços perduráveis e que não encontram barreiras nem na idade, nem no sexo, nem na morte eminente de um ou na longa vida do outro. E depois, para além do texto magnífico e brutalmente bem interpretado, tenho de falar no que não se costuma falar muito nestas ocasiões. Nos tempos. Nas pausas. Nos olhares. Esta trilogia “técnica” foi uma das tónicas da representação que veio acentuar, mais ainda, o profissionalismo dos actores, da encenadora Catarina Caetano, da assistente de encenação Sónia Setúbal e do luminotécnico/sonoplasta Nuno Borda D’Água. Uma equipa a não mexer.

Falta escrever que foi levada à cena nos dias 13, 14 e 15 de Junho, na black box do Cine-teatro Curvo Semedo, na minha cidade de Montemor-o-Novo, e que, se fosse eu que mandasse, partiria já amanhã em tournée até ao fim do Mundo.

In "O Montemorense" de 20 de Junho de 2014

domingo, 15 de junho de 2014

Os filhos não vêm com manual de instruções (mas deviam)



Esta cronicazinha foi escrita e publicada nos idos de 2008, quando os meus filhos estavam em plena adolescência. Os tempos passaram mas o texto é como se tivesse sido escrito ontem. Aqui fica ele com votos de bom Domingo.



A frase do título foi escrita por alguém (não me lembro quem) que pretende alertar os pais, e adultos em geral, para o facto de cada criança ser um universo que deve ser respeitado em todas as vertentes. E que o que serve para uns não serve para outros, e mánasêquê… Não concordo. E em vez de estar para aqui com grandes lérias, passo a contar o que aconteceu recentemente cá em casa:
“Domingo vamos TODOS almoçar a casa de um amigo”, anunciei democraticamente, num destes dias, a toda a família. “E vai ser prolongado, como eu gosto”. “Eu não posso”, disse-me o João Miguel. “Tenho de estudar História.” (Deves! - pensei) “Eu também não”, avançou o Pedro. “Tenho de ir ter com o Fabinho para jogarmos Pleisteixón”.(‘Tá bem, abelha!- resmordi) “E eu tenho o almoço de anos da Gabi”, concluiu a Joana. (P’ró ano - murmurei.)
Perante estas manifestações igualmente democráticas por parte da filharada, que eu amo e respeito, olhei para a mãe deles à procura de solidariedade, aclarei a garganta e esclareci: “Eu não PERGUNTEI se queriam ir almoçar à casa de um amigo. Eu ANUNCIEI que íamos TODOS almoçar à casa de um amigo. É substancialmente diferente.”
Os sorrisos amarelos sucederam-se. As bochechas descaíram, flácidas, contrariadas, e a minha fofa, sempre atenta às minhas diatribes, apologista da união familiar, principalmente à hora das refeições – que para ela é sagrada - , abanou a cabeça em sinal de desaprovação. E segredou-me: “Tens de ser mais tolerante, coitadinhas das crianças”.
Os filhos, na verdade, não precisam de manual de instruções. A gente vai-lhas dando aos poucos. As mulheres, sim. Em 10 volumes. E com actualização mensal.

terça-feira, 3 de junho de 2014

O Sol do nosso descontentamento


 


O Sol voltou mas foi só no azul do céu, porque, de resto, continuamos com um longo Inverno a atravessar as nossas vidas, o Inverno do nosso descontentamento, como disse um famoso rei inglês que Shakespeare fez questão de arrastar para o palco.

Continuamos, portanto, a aguardar eternamente, como borregos mansos e felizes, que nos sejam devolvidos os nossos direitos como cidadãos e trabalhadores. O Governo de Passos Coelho continua, portanto, nitidamente, a omitir verdades, a esconder sabe-se lá o quê, com o apoio da sua noiva de conveniência que continua a querer ser Minister no lugar do Minister. Continuamos, portanto, à espera que nos respeitem como portugueses, como pais, como filhos, como operários deste país quase em ruínas.

Podes esperar sentado”, disse-me a fofa, desta vez pessimista e rezingona. E eu, que confio nela, não me sentei. Deitei-me.


In "O Montemorense", de 20 de Maio 2014

Distraídos crónicos...


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