I
Parte-se para o
papel em branco ainda sem temas definidos, mas sempre com uma voz a bater forte
cá por dentro: “Não quero falar da guerra, não quero escrever sobre a guerra,
nem sobre as crianças que choram ao som das sirenes e dos bombardeamentos. Não
quero regressar a 1939-45, nem a outras datas, que estão cada vez mais
presentes no nosso quotidiano.”
As perguntas e as
críticas que todos nós fazemos e que, orgulhosamente, ostentamos nas redes
sociais, transformam-nos nuns “enormíssimos” e “competentes” analistas
políticos de fim-de-semana que, e com todo o respeito pelas excepções, não
percebem nada do que estão a dizer. Parece que agora somos todos estrategas
militares, líderes, membros do Parlamento Europeu ou das Nações Unidas, comandantes
de pelotão, soldados milicianos de cocktails molotov em punho. A maioria
ataca Putin e defende Zelensky, uma minoria defende o poder russo sobre as
antigas repúblicas soviéticas, num saudosismo doentio e perigoso, e outros ainda
não conseguiram pronunciar-se de forma aberta sobre a sua posição.
É impossível
analisar de forma correcta, ao minuto e em directo, os acontecimentos terríveis
que já fizeram milhares de mortos e milhões de refugiados, estando o povo russo
e o povo ucraniano a serem ambos vítimas de um ditador eleito (onde é que eu já
li uma coisa parecida?). Os mortos, os feridos, as famílias separadas, os bens
destruídos, tudo será contabilizado mais tarde. Porque a História que hoje
vivemos só então será analisada, quando os especialistas estiverem de posse da
maior parte dos dados, para que a narrativa seja clara e concreta. Aí ficaremos
a conhecer os profundos porquês destes verdadeiros crimes de guerra, para que
não haja dúvidas sobre a autodeterminação legítima do povo ucraniano e para que
se condene a decisão absolutamente anacrónica, estúpida e fascizante de se
invadir um país livre, ainda que não se concorde com o seu governo ou a suas
alianças geo-económico-políticas.
Há ainda os que criticam a posição
letárgica da Europa, dos Estados Unidos e da NATO em termos de acção militar. Se
os Estados Unidos e os países da NATO tivessem pegado em armas, vivíamos hoje o
que nunca teríamos imaginado viver: o terror de uma terceira guerra mundial.
Duas chegaram e sobraram. Putin é, nesta altura, um homem politicamente
derrotado e cada vez mais só. Tenho a certeza de que, a seu tempo, os Tribunais
Internacionais julgarão e condenarão o presidente da Rússia por crimes de
guerra e aí, só aí, se fará justiça.
Um último parágrafo, que deveria ter
sido o primeiro, para saudar os jornalistas de todo o mundo e, sobretudo, os portugueses, que todos
os dias arriscam a vida para nos mostrarem os dados sempre actualizados desta
guerra desnecessária, tal como são todas as guerras.
II
Da nossa santa
terrinha falei há dias com pessoa amiga. E falámos do rio. Do nosso Rio
Almansor, cartão de visita para quem entra em Montemor, vindo do Sul. Um
frondoso matagal cobre todo o leito, escondendo o escasso fio de água que vai
correndo timidamente por ali.
Também falámos do
pouco tempo que o novo executivo ainda tem em funções e que, provavelmente, não
tem tido uma agenda muito livre para pensar nesta questão. Sabemos que Olímpio
Galvão e a sua equipa já nada podem fazer pela Rua de Aviz nem pelo Largo da
Câmara (o que é pena, na minha opinião!). O que está feito, feito está. Mas
ainda vão muito a tempo de alterar o estado em que o rio se encontra. É preciso
financiamento, é verdade, mas também é fundamental a vontade política.
Depois de limpo o
leito do rio e de transformadas algumas zonas em espaços de caminhada e lazer,
Montemor mostrar-se-ia mais atractivo logo assim que se atravessasse a Ponte de
Alcácer. Depois, era só repovoar o rio com as espécies que sempre o habitaram:
carpas, barbos, pardelhas, enguias, bordalos... E, a seguir, era só pegar numa
cana de pesca e recuperar a infância perdida.
III
Montemor está a
tornar-se um local menos seguro do que era há uns meses. Já passámos na
televisão por motivos menos bons, o que nos leva a concluir da necessidade de
uma maior atenção por parte das autoridades em relação a determinadas questões.
Assaltos, roubos, violência física começam a estar na ordem do dia. São
situações que acabam por afastar quem, por motivos de trabalho ou de lazer,
goste da cidade e a queira adoptar como sua. Para não falar das vítimas, que
gostariam, sobretudo, de não o terem sido.
Os valores morais
e sociais começam a ficar desfocados e, nas próprias escolas, notamos
comportamentos cada vez mais desadequados por parte de alguns alunos, o que
torna esta questão do ensino-aprendizagem muito mais complicada do que ela já
é. O mais curioso é que, confrontados com as atitudes menos positivas dos seus
educandos, alguns encarregados de educação respondem, de forma inocente: “Já
eu era assim quando tinha a idade dele!” E pronto.
Não me venham com
cantigas de que o professor deve dar aos seus alunos a educação que estes,
eventualmente, possam não receber em casa. Eu raramente o faço. Ensino as
matérias e mostro-lhes que o mundo, fora da escola, é composto de muitas mudanças
e contrariedades, mais facilmente combatíveis com as atitudes certas. A escola
não pode substituir os pais na educação dos filhos. É um complemento e deverá
sê-lo sempre, mas eu sou professor dos meus alunos, não sou pai deles. E eles
sabem disso. E os pais deles (muitos deles
foram meus alunos) também
João Luís Nabo
In "O Montemorense", Março de 2022
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