domingo, 30 de março de 2008

"Os filhos não vêm com manual de instruções"



A frase não é minha. Por isso é que está devidamente ‘asperizada’. Foi escrita por alguém (não me lembro quem) que pretende alertar os pais, e adultos em geral, para o facto de cada criança ser um universo que deve ser respeitado em todas as vertentes. E que o que serve para uns não serve para outros, e mánasêquê… Não concordo. E em vez de estar para aqui com grandes lérias, passo a contar o que aconteceu recentemente cá em casa:
“Domingo vamos TODOS almoçar a casa de um amigo”, anunciei democraticamente, num destes dias, a toda a família. “E vai ser prolongado, como eu gosto”. “Eu não posso”, disse-me o João Miguel. “Tenho de estudar História.” (Deves! - pensei) “Eu também não”, avançou o Pedro. “Tenho de ir ter com o Fabinho para jogarmos Pleisteixón”.(‘Tá bem, abelha!- resmordi) “E eu tenho o almoço de anos da Gabi”, concluiu a Joana. (P’ró ano - murmurei.)
Perante estas manifestações igualmente democráticas por parte da filharada, que eu amo e respeito, olhei para a mãe deles à procura de solidariedade, aclarei a garganta e esclareci: “Eu não PERGUNTEI se queriam ir almoçar à casa de um amigo. Eu ANUNCIEI que íamos TODOS almoçar à casa de um amigo. É substancialmente diferente.”
Os sorrisos amarelos sucederam-se. As bochechas descaíram, flácidas, contrariadas, e a minha fofa, sempre atenta às minhas diatribes, apologista da união familiar, principalmente à hora das refeições – que para ela é sagrada - , abanou a cabeça em sinal de desaprovação. E segredou-me: “Tens de ser mais tolerante, coitadinhas das crianças”.
Os filhos, na verdade, não precisam de manual de instruções. A gente vai-lhas dando aos poucos. As mulheres, sim. Em 10 volumes. E com actualização mensal.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Os bebés são uma seca *



Pois são. Emitem sons irritantes e sem significado, que me confundem de sobremaneira. Miam, grunhem, berram, guincham, como se tivessem de pagar impostos todos os dias. Por exemplo, como traduzir Brrr! Lááááá! Hiiiiiiiii! Ôhhhhhh! Máaaaa! Páaaaa! Túuuu! Môooooo! Impossível, não é? Cada uma das expressões (?) é mais enigmática que a anterior. Ninguém devia conseguir entendê-los.
Se têm calor, choram, se têm frio, choram, se têm sono, choram, se têm fome, choram, se estão felizes chilreiam vocábulos incompreensíveis, que só a mãe e as avós entendem. E respondem-lhes, convencidas de que estão a travar uma conversa decente e equilibrada. Tenho pessoas na família (e vocês também, caros leitores) que conseguem falar durante mais de 30 segundos com um bebé de 15 dias!! Estonteante, não acham? Já observaram um adulto a falar com um bebé de 15 dias? Fica com ar mais idiota que o do próprio bebé, que só quer sopas e descanso: “Olá! Tá bom, mê quido? Góta da tia, góta? Góta da mamã e da vovó? Góta, góta! Quem é o lindo da mamã, quem é? Qué vi ó colinho da tia gôda, qué?”
Digam-me lá se não é triste? É. Triste. Penoso. Obtuso. O que pensará o bebé sobre a tia “gôda”? Que, para além de ter uma verruga enorme por cima do buço, é “gôda” e… estúpida, claro. Desculpem, mas nunca fui capaz de papéis assim.
Meio preocupado com esta minha recusa natural, tento perceber por que não dizem eles palavras ar-ti-cu-la-das. Então, se os psicólogos (vou ser vítima de violência doméstica) dizem que o bebé faz uso da sua capacidade auditiva quando está no útero materno, se sabe que o mundo existe, por que é que não há-de aprender a falar? Se fica nervoso quando a mãe stressa, se fica deprimido quando o pai se exalta, se fica calmo quando a mãe põe um CD do Tony Carreira, por que é que não toma atenção aos actos de fala e não sai lá de dentro com conversa de gente?
Ah, e há outro pormenor que também me aborrece um bocadinho e que me leva a recusar disfarçadamente o convívio com bebés. Os bebés cheiram mal. Sim. De três em três horas, cheiram mal. O que me parece ser bastante desagradável. Detesto pessoas a cheirarem mal ao pé de mim e os bebés não são excepção.
E, depois, há ainda outra questão relacionada com os bebés que me deixa inquieto: por que é que, ainda na maternidade, toda a gente desata a tirar parecenças, observando o recém-nascido como se fosse um animalzinho no zoo? Quando os meus filhos nasceram, as avós e a Condessa de Arraiolos, que é muito cá de casa, transformaram os pobres recém-chegados nuns autênticos monstros de Frankenstein, tal foi a manta de retalhos em que os transformaram: “Têm as orelhas da avó, e o nariz do avô, e as mãos de pianista da trisavó que Deus tem, e as sobrancelhas da prima do Brasil e os olhos são tal e qual os da tia Lucinda do Barreiro… E as bochechas são as do primo Ludgero.” (Quem é esse primo Ludgero?, perguntei à minha fofa, também ela sem saber quem era a tia do Barreiro). Fiquei alarmado: nem uma parecença comigo ou com a mãe. Estive quase para telefonar para a maternidade. Aqueles seriam mesmo os nossos filhos?
Perguntam os meus nove leitores (dez, com a Condessa de Arraiolos): será que ele não gosta dos filhos, dos sobrinhos ou dos primos e primas? Mas que malvado! Como é possível ter um ar tão simpático e inteligente (sobretudo, inteligente) e não gostar das pessoas do seu próprio sangue? Sonso é o que ele é!
Claro que gosto. Esses meus familiares vão crescendo, felizmente. Hoje, alguns deles já adultos, já falam como gente, já me ensinam a fazer crepes aos Sábados, ao fim da tarde, já passamos férias juntos, já se sentam à mesa comigo, já discutimos religião, política, cinema checo e bailado contemporâneo e já emborcamos, de vez em quando, umas belas imperiais.
E têm outra característica que os favorece: já não guincham constantemente, nem cheiram mal de três em três horas. Então, por que é que não havia de gostar deles?



* Há uma vovó que não vai concordar comigo. Um dia, estarei eu de acordo com ela. ;)

domingo, 23 de março de 2008

Estou em pancas

Qualquer dia, tenho a ASAE cá em casa a investigar o fogão, os armários da cozinha e o tamanho da escova de piaçaba. Acredito que, após denúncia, numa rusga bem planeada, venham investigar também se o meu piano está afinado (estou à espera do Ulf Ding!!!) e com as cordas-padrão da Comunidade Europeia. “Não, não”, dirá o Inspector de diapasão em punho, “este fá bordão tem de ser já confiscado. Está desafinado e incomoda o vizinho do lado.” E até temos um inspector-poeta que rima com mestria, enquanto cumpre a sua inefável missão.
Qualquer dia (qualquer noite), lá terei um inspector da ASAE no meu quarto, recém-pintado de azul-império, em silhueta na contra-luz da janela ou sentado aos pés da cama, a dizer-me como e com que intensidade é que eu devo abraçar a minha fofa.
Já faltou mais.

sábado, 22 de março de 2008

...E ninguém faz nada? Parte 2

Pronto:
1-A professora apresentou queixa;

2-O novo estatuto do aluno diz que, nestes casos, a aluna deve ser transferida de escola (isto é, transfere-se o problema mas não se acaba com ele);

3-Espero que ela não seja transferida para uma escola que eu cá sei; é capaz de ser muito longe...

4-O Conselho Executivo da escola onde a professora foi agredida diz que ainda não tem o regulamento interno actualizado e que, portanto, o novo estatuto do aluno ainda não faz parte da coisa;



Em suma: nada vai acontecer.



Afinal, o telemóvel até era da aluna... que, pelo que me foi dado a ver, até tinha ar de anjo.

Alface revisitado


A saudade leva-nos a estes encontros. A palavra foi o pretexto para, no dia 15, falar do João Alface. Ou teria sido o João Alface o pretexto para falar da palavra? Não importa, porque ele também não se importaria. Foi uma tarde de memórias, de música e de literatura. O Theatron organizou e outros amigos juntaram-se a eles, na Carlista, para este momento especialíssimo que foi uma visita ao futuro e uma festa à vida. Porque há homens que quanto mais longe… mais perto.

sexta-feira, 21 de março de 2008

De Montemor para o Mundo


No Dia Mundial da Poesia, um Poema para uma Sexta-feira (dita) Santa:

CRISTO

Trazia nos pés
O cansaço
Duma vida penhorada!
No olhar
A incerteza de uma garrafa
Vazia!
Respirava no silêncio
A asma, afome,
A azia!
Subitamente,
Ao olhá-lo,
Sucedeu o imprevisto:
Vi naquela criatura
Um homem igual aos outros...
Mas mais parecido
Com Cristo!

Manuel Justino Ferreira (1928-2002), in Poeta que parte... Poemas que ficam (2004)

quinta-feira, 20 de março de 2008

...E ninguém faz nada?

Uma professora foi humilhada, insultada e agredida no decorrer de uma aula, numa escola secundária do Porto. Não há mecanismos que ponham alunos daquele calibre na ordem. Simplesmente não há... porque podem ficar traumatizados, coitadinhos.
Relato dos acontecimentos (e alguns comentários, se calhando, desnecessários):
1-A aluna usou o telemóvel numa aula: era proibido.
2-A professora usou de contacto físico: primeira estupidez absoluta.
3-A aluna e os colegas da turma tiveram um comportamento de verdadeiros animais: os alunos deveriam ser suspensos e os paizinhos chamados a contas, inclusivamente aquele rapaz da associação de pais que anda a mandar umas bocas oleosas contra os profs.
4-A professora não apresentou queixa: segunda estupidez absoluta.
5-A aluna não foi suspensa: cobardia de quem manda na escola.
Se o Ministério da Educação lançou uma Reforma para o Ensino, em que artigo da coisa é que estas situações estão previstas? Em nenhum. Terceira estupidez absoluta.
Conclusão: A Prof.ª Maria de Lurdes Rodrigues nunca deu aulas na Carolina Michaëllis, no Porto.

Os números são irrelevantes?



Nunca fui muito de manifestações, de braços no ar, de gritos, de palavras de ordem… Mas não me foi possível, nem aos restantes 99.999 professores, ficar em casa no Sábado, dia 8. Não barafustei muito, porque não é do meu feitio esse tipo de desabafos em público, mas estive lá, na Praça do Comércio, com a minha fofa (que até estava doentinha) e com uma amiga, essa sim, muito revolucionária e berlingueira, que não se calou nem um minuto, a viver agora o seu 25 de Abril.
De regresso a casa, vim a dar no pedal para chegar a tempo de ver os telejornais. Liguei as televisões todas, cada uma em seu canal, e fiquei completamente abismado com o facto de os titulares da pasta da Educação dizerem que os números não eram significativos e que o que importava era a aplicação da lei e não a discussão de alternativas. Fiquei estúpido.
Quando a Prof.ª Maria de Lurdes Rodrigues verificar que é humanamente impossível pôr em funcionamento o que nos pede, então talvez dê razão a quem, nas escolas, sabe as linhas com que isto se cose. Quando o ministério chegar à conclusão que passaremos a formar crianças com conhecimentos cada vez mais periclitantes, e que nos estão a obrigar a dar mais importância aos números (aqui, sim, os números são significativos para a Prof.ª Maria de Lurdes), esquecendo o ensino de matérias propriamente dito, então talvez já tenhamos dado à luz a primeira geração de analfabetos com a escolaridade obrigatória e, aí, talvez seja tarde para recuar.
Ainda assim, nunca deixei de estar a favor da Prof.ª Maria de Lurdes Rodrigues no que se refere a um ponto que é, para mim, importante. Em 33 anos de democracia e de reformas, conseguiu a senhora Professora o que nunca nenhum político ou sindicalista tinham conseguido antes: unir os professores e conceder-lhes o estatuto de classe profissional.
Já o senhor Rangel, numa sua crónica publicada no Correio da Manhã do dia 8, refere a vergonha que sente “destes pseudoprofessores que trabalham pouco, ensinam menos, não aceitam avaliações e [se] transformaram em soldados do Partido Comunista”. Eu também sinto vergonha, mas é de o senhor Rangel ser Português como eu. Cá para mim, com tantos elogios ao Governo e tanto ódio aos professores, deve estar à espera de algum tacho.
O Rangel é um habilidoso!
O Rangel veste-se mal!
O Rangel usa ceroulas de malha!
Se o Rangel é Português eu quero ser Espanhol!
O Rangel é Emídio. Pim!
Era uma vez um ministro chamado Carlos Borrego que, em 1993, foi substituído de uma hora para a outra depois de ter contado uma anedota sobre a morte de doentes hemodializados que tinham falecido, no hospital de Évora, havia pouco tempo. Bastou uma anedota para que fosse rapidamente despachado. De muito mau gosto, é certo. Mas era apenas uma anedota

domingo, 24 de fevereiro de 2008

A Farsa de São Pascoal


Bernardino Samina, seria impensável começar este breve apontamento de outra forma, criou no dia 23 de Fevereiro, no Cine-Teatro Curvo Semedo, em Montemor, uma personagem de difícil interpretação. Talvez a mais complexa da sua carreira de actor amador. Um risco que durou 90 minutos, resultado de um incomparável acto de coragem (e de consciência artística) e que teve o apoio, em palco, do restante elenco do THEATRON.
O preso/idiota/espertalhão PASCOAL, a personagem principal da comédia Farsa em São Bonifácio, um texto de autor anónimo adaptado por Maria João Crespo para esta produção do Theatron, veio recuperar, de certa forma, a tradição que vem do teatro vicentino, na figura do bobo, trazendo-me também à memória a personagem do jester, tão fascinante quanto perturbadora, figura fundamental em muitas peças de Shakespeare. Às duas figuras tudo era permitido pelo simples facto de serem, digamos assim, os idiotas de serviço.
Foi neste paradoxo que residiu todo o desenvolvimento da trama a que assistiu uma sala quase cheia: a figura com mais poder, o detentor de todos os segredos era, afinal, o mais humilde dos homens, o aparentemente menos brilhante em termos intelectuais, o sem-família e sem-tecto, o… parvinho da aldeia. Contudo, Pascoal, consciente das suas necessidades, observador e intérprete atento dos vícios e das misérias dos outros, fez da sua condição de marginal a origem dessa esperteza. Conseguiu, assim, usando de estratagemas que nos fazem lembrar os das personagens vividas pelo saudoso actor António Silva, dominar todos os outros elementos daquele grupo, atormentados com defeitos e vivências passadas que não queriam ver regressar. O idiota de serviço transformou-se, graças à sua inteligência, e à natureza humana, na voz da consciência de cada um.
Todo o elenco merece o nosso aplauso. Mas Bernardino Samina esteve incomparável: na géstica, na voz, nos apartes e, sobretudo, na componente trágica que conseguiu manter de forma constante na interpretação da sua personagem, mesmo quando arrancava do público as gargalhadas mais espontâneas.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Estou triste


Tive um sonho mau e que me parece premonitório: sonhei que se tinham acabado nas tascas deste país as perninhas de rã, o carapauzinho de escabeche com dois dias de exposição e as iscas com muito alho e louro a gosto. Que tinham passado a contrabando os copo de vidro de 3 e de 5 e que os traçadinhos eram vendidos às escondidas. Que se tinham finado os croquetes de bacalhau à antiga portuguesa, as tiras de choco e a orelha de porco de coentrada. Que passaria tudo a ser confeccionado, embalado e entregue ao domicílio por empresas especialistas, tudo sem micróbios, sem bactérias, sem sabor.
O que se acabou mesmo foi o CD pirata, o filme corsário e o frango com pó de feira. Acabou-se o cigarrinho fumado com prazer, com os amigos, à mesa do café, depois de uma bifana no prato, de uma mariscada ou, simplesmente, depois do cigarro fumado antes. Portugal castiço está a sucumbir às mãos desse exército anti-Portugal à maneira, que nos vai deixar a todos embalados, limpos, desinfectados e… tristes.

terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Estou incrédulo *


Contaram-me que vai ser proibido usar engodo e isco nas pescarias. Consta que os pescadores de água doce, em cuja classe me integro com muito orgulho, vão passar a utilizar o telemóvel para, qual Santo António modernaço, contactarem os peixinhos: “Olá, senhor Barbo, eu sou o Jonny e quero pescá-lo. Não o posso encharcar de engodo, nem usar aquelas larvas das moscas varejeiras por causa da ASAE que não quer que lancemos detritos para dentro das albufeiras. Quer vir dar uma mordidelazinha no meu anzol? Obrigado. Eu espero!.. Ai, agora não pode ser? A sua mulher está a desovar… pronto, fica para a próxima. Ouça, pode dar-me o número da D. Carpa Inglesa que deve andar por aí? ’Brigadinha!”
* Este é, provavelmente, o texto mais idiota que escrevi. "Não sejas tão optimista", dirão vocês. "O 'provavelmente' não faz lá falta nenhuma."

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Estou com um enorme ataque de riso


Os ministros da Saúde e da Cultura saíram sem honra nem glória, deixando atrás de si um passado de asneiras infindáveis, com despedimentos, encerramentos e até momentos dramáticos pelo meio. Foram embora. É a história das moscas. Umas saem, outras entram. Mas há sempre qualquer coisa que se mantém. É a velha história.
Quem será a próxima a sair? Quem? Quem? Ná… Não vamos ter essa sorte.

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Estou com um ataque de riso

Nos idos anos 80, o Eng. Sócrates assinou uns projectos de umas casas manhosas, tristes, sem graça nenhuma, o que não abona muito em seu proveito. Se calhar, os recém-licenciados deviam só arranjar emprego quando tivessem aquele diploma das Novas Oportunidades, que é quando já têm alguma experiência de vida. São feios aqueles prédios e não parecem muito de confiança em termos de robustez. Estão como o país. Mas eu não acredito em coincidências. O técnico é o mesmo.

sábado, 2 de fevereiro de 2008

"Estou sim? Daqui é a Pamela!"




Foi assim, como se lê no título, que começou a nossa conversa telefónica. Como não conheço nenhuma Pamela que me fale ao telefone com a voz sensual daquela Pamela… desconfiei.
Queria fazer-me um teste de cultura geral. Mas, antes, perguntou-me o nome completo, a idade, a profissão, o estado civil, o meu ordenado, o endereço, as minhas aptidões em vários campos. Fez-me perguntas a que qualquer miúdo da pré-primária responderia e, depois, disse-me: “Parabéns!!! Você foi o único que, até agora, respondeu a todas as questões! Amanhã vão aí a casa dois senhores, devidamente credenciados, entregar-lhe o seu merecido prémio e para conversarem um pouco com o senhor por causa de um apartamento no Algarve”. Respondi que sim, que estaria lá com o meu Rottweiler (que comeu uma orelha à pobre Laika, faz hoje uma semana), uma espingarda de canos serrados e mais dois soldados da GNR para os receber.
Ninguém apareceu. Pergunto-me porquê.
E a Pamela, a marota que ao telefone me achou tão simpático e atraente (só mesmo ao telefone), nunca mais telefonou. Eu que até a tinha convidado para um lanche romântico, ao cair de uma destas tardes, na exótica esplanada da Sociedade Recreativa cá do burgo…

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Parem! Quero descer



Que o corte feito nos orçamentos das autarquias já começou a ter efeitos perniciosos nas actividades das associações culturais e desportivas dos concelhos, disso não temos dúvidas.
Os subsídios diminuiram, os apoios directos com funcionários e meios logísticos foram reduzidos e o país pode começar a atravessar, em termos de província, um deserto cultural, porque sem dinheiro não há forma de promover, com um mínimo de condições, as mais variadas iniciativas que envolvam grupos mais numerosos ou associações que, against all odds, ainda por aí vão remando. Também nem toda a gente pode ser o La Féria. (Ainda bem.)
Uma coisa é certa: as associações desportivas com menos meios correm o risco de fechar as suas portas, dezenas de crianças poderão deixar de praticar desporto, os agentes culturais (coros, bandas, orquestras, grupos folclóricos, grupos de teatro) deixarão de poder produzir e promover as suas iniciativas e, mais grave ainda, ficarão impedidos de divulgar o seu trabalho fora da sua zona de actuação. Mas há uma contrapartida que me deixa animado: sem concertos, representações teatrais, folclore e et cetera, vamos ficar com mais tempo para, no remanso do lar, ver os Morangos com Açúcar e aquela novela para atrasados mentais a que dão o nome de Floribella. Conheço várias maneiras de censurar a liberdade de expressão. A nossa História é nisso um portento. Este é realmente perverso… mas eficaz.
Tempos houve em que a trilogia dos Efes deu sossego aos políticos. O povo, embrutecido, ignorante e estupidificado, rezava o terço, ouvia fado e, aos Domingos à tarde, de ouvido colado ao degradante rádio de pilhas, gritava pela sua equipazinha favorita. Se repararmos, os Efes estão a voltar, para grande alegria dos actuais políticos. Governo e Oposições (ainda há?) batem cada vez mais na mona do Zé, mas o Zé (re)começa a pensar que tudo isto é, mais do que o destino, a vontade expressa de Deus. Há um Efe que nunca mudou, nem que mude o Governo todos os dias. Desse Éfe é que ninguém se livra. E alguns até parecem gostar.
Parem Portugal. Quero descer.

TPC de Língua Portuguesa sobre a TLEBS*



A Telebch

Eu gosto munto da Telebch. Se não foçem estas novas regras, eu nem sabia escrevere como deve sere.
A Telebch é munto útil por que açim sabemus espressar melhor as noças ideias. Por ezemplo: eu dantes não sabia o que era uma frikativa. Pensava que era uma posissão secsual. Mas não. É um modo de articolação das consuantes. Quem diria!? Mas do que eu mais gustei foi do preficsso mudificador. É mais intereçante que a derivassão regreçiva. Mas o meu culega Águsto prefere um composto murfulójico córdenado. Dis ele que o faz alembrar as férias em que participou numa fexta de natoristas, na praia dos Tumates.
Como me agradou a Paraçíntese!! E o verso aussiliar aspectoal?? Sem cunhesser extas coizas nunca teria sido capas de fasere um teixto açim, tam bem escrito. Obrigada Senhoura Menistra. Devirtasse no Carna Vale.


Viturina Dassilva

*Terminologia Linguística para os Ensinos Básico e Secundário

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

"Obviamente, demito-o!"

Passou por Montemor em 1958, em campanha para as presidenciais que viriam a revelar-se uma das maiores fraudes eleitorais de sempre. Um amigo meu fez-me uma cópia desta foto tirada ao General Humberto Delgado no então Largo de Serpa Pinto, em Montemor-o-Novo.
O Presidente do Conselho não gostou muito daquela ideia da demissão, caso Delgado vencesse as eleições.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Expliquem-me... se souberem!


Semi-laico?

Ainda não percebi se o Estado português é laico ou não. Não é que isso me dê muita preocupação, mas agora que querem proibir a atribuição de nomes de santos aos estabelecimentos de ensino, gostava de saber se é por causa desse pormenor ou se é por pura borreguice socialista.
A História de Portugal, como território europeu e como nação independente, está inserida num contexto cultural muito mais alargado que é o de toda uma Europa cristã, assim tornada após a saída dos árabes da Península Ibérica, com a conquista do Reino de Granada, em 1492. Até aqui, não dei novidades a ninguém. A religião cristã e, no caso da Europa ocidental, a religião Católica, esteve sempre na base da maioria das decisões políticas dos vários estados europeus que viam o rei como o detentor do poder que lhe fora atribuído por Deus. Logo, também por cá fomos culturalmente formatados por governantes assim iluminados que foram mandando umas bocas por aqui e por ali, segurando a espada com a mão direita e a Bíblia Sagrada com a esquerda, desbravando, matando, proibindo, permitindo, justificando, por vezes, com a fé o que era injustificável… Vamos agora ficar amuados com o D. Afonso Henriques, porque ele escreveu ao Papa Inocêncio II a prestar-lhe vassalagem e a pedir o reconhecimento formal do Condado Portucalense? Ah, o maroto do menino Afonso que começou mal esta coisinha chamada Portugal… Vamos ignorar que somos país, porque um Papa assim o reconheceu? Respondam vocês.
O nosso Estado nunca teve, portanto, uma origem laica. E, mesmo depois do 25 de Abril, e acalmados os ânimos anticlericais que grassaram estupidamente por essa altura, o Estado esteve sempre ligado à Igreja de Roma, porque uma tradição de 800 anos não se quebra com meia-dúzia de revoluções, uma com cravos outras sem.


Abaixo os Santos? Os Pintos? Os Sousas? Os Pinto de Sousa?

Será que os governantes de hoje não reconhecem a importância da Igreja Católica como colaboradora activa na estruturação das mentalidades do pessoal cá deste triste burgo? Custo a acreditar. Por isso, quando me dizem que o Governo português quer acabar com a atribuição de nomes de santos a escolas, recusei aceitar tal ideia estapafúrdia. No entanto, eles tem de se entreter com alguma coisa, nem que seja a escrever leis sem sentido.
Nesse caso, que sejam coerentes. Se não há nomes de santos para as escolas, também não o haverá para coisa nenhuma: nem para freguesias, nem para hospitais, nem para ruas, nem para largos, o que se revela como um perfeito atentado à Cultura do país, para além de um certo estreitamento intelectual. E, para serem definitivamente consentâneos e rigorosos, vão decerto cancelar os feriados que a Igreja Católica nos oferece: dia da Santa Mãe de Deus (1 de Janeiro), a Sexta-Feira da Paixão, o dia do Corpo de Deus, o dia da Assunção de Nossa Senhora (15 de Agosto), o dia de Todos os Santos (1 de Novembro), o dia da Imaculada Conceição, coroada Padroeira de Portugal por D. João IV (8 de Dezembro), e o dia de Natal.
Mais ainda: lá teremos de, por decreto governamental, rasgar todos os manuais de História, teses, artigos e estudos sobre Portugal, os portugueses, os Descobrimentos, a Evangelização. Vamos fingir que não existiram figuras como o padre António Vieira, São João de Deus, Santo António de Lisboa, a Rainha Santa Isabel ou D. Sebastião. Vão começar a figurar nos livros de História e nos compêndios de Literatura como o Vieirinha Pregador, o Joca Montemorense, o Tony Alfacinha, a tia Bé e o tio Bábá. Porque tudo não passou de um engano com séculos de duração. Santos? Mártires? Ná! Tudo um lapso! Tudo um embuste.

12 de Março de 2005

Não se pretende com este alinhavar de pensamentos ajuizar do peso positivo ou negativo destas nossas origens culturais e da influência da religião Católica em muitas das atitudes políticas dos nossos reis e de alguns presidentes. Isso ficará para depois. O que não consigo aceitar é que um Estado que se proclama laico, isto é, sem religião oficial, queira obrigar os cidadãos do seu país a negar séculos de História e de Cultura e a recusar-lhes o direito de dar largas à sua liberdade, inclusivamente à religiosa.
Depois de alguma reflexão, só me resta concluir, lamentavelmente, que a História de Portugal começou no dia 12 de Março de 2005, quando o actual governo tomou posse no palácio da Ajuda. Antes disso, tudo não passou de um conto de fadas.


Hipocrisia

Que contradição é esta que, num estado laico e socialista, permite que se continue a transmitir Missa de Domingo no canal estatal, ao mesmo tempo que se quer retirar das salas de aulas os crucifixos e suprimir do protocolo de Estado a presença dos representantes eclesiásticos? (Por que não alargar essa representação a outras igrejas e confissões?)
Um aluno meu que leve um crucifixo no fio, um quipá judaico na cabeça ou um véu muçulmano no rosto não aprende nem mais nem menos Inglês por causa disso. E tem todo o direito de manifestar os valores da sua fé. E não deve ter vergonha dos princípios em que acredita ou em que acreditam os seus pais ou o seu povo. O nosso problema e o problema do Estado, que nos tenta à viva força transformar em proletários marxistas, sem vontade própria, foi termos vivido durante largos anos aparentemente felizes e profundamente cinzentos sem a possibilidade de convivermos dentro de portas com pessoas diferentes, o que facilitou a caracterização imbecil que faziam de nós: um povo de brandos costumes. Hoje, tal como ontem, há o medo da diferença. E isso é sintoma de racismo e xenofobia por omissão, com um aroma a estalinismo mal disfarçado.
É preciso desviar outro Santa Maria, é preciso outro General Sem Medo vir receber um ramo de flores no Largo da minha cidade que tem o seu nome, é urgente outro 25 de Abril, agora feito com mais cuidado e sem maluquices de maior, é preciso um sinal que abane os surdos e os cegos que muitos colocaram a governar este acampamento.
O Estado precisa, pois, de ser reformado. Aproveitem, agora que andam com esta ciguêra de reformar tudo.


Afinal de contas…

…Por que motivos o Governo não recebeu em pé de igualdade Sua Santidade o Papa, Sumo Pontífice da Igreja Católica, e Sua Santidade o Dalai Lama, do Tibete? Teve medo da Vingança do Chinês?
…Como é que se aceita que o ex-governante António Guterres, laico e socialista como o padrinho Mário Soares, tivesse como confessor o Padre Vítor Melícias? Mas que raio de laicismo é este? Há, porventura, um estatuto que permite esta mistela de socialista laico católico praticante? Ou sou eu que já não estou a bater bem?

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Ler não mata*: Último Acto em Lisboa



Ler romances onde a acção se passa em locais conhecidos do leitor é, sem dúvida, fascinante. Nós lá andamos com as personagens, com o narrador, a subir e a descer as ruas, a frequentar os cafés e as esplanadas, a visitar este ou aquele espaço que o escritor achou por bem incluir como cenário da sua estória. Há escritores portugueses que assim fazem, o que é perfeitamente natural, o que nos leva a saborear o texto de uma forma mais… prática.
E se o leitor fizesse estas “viagens” dando cumprimento a um capricho de um escritor… britânico? Pois Robert Wilson escreveu um romance policial cuja acção se desenrola em diferentes épocas, em Berlim, em Lisboa e nas nossas Beiras. Apanhado no meio de uma arquitectura novelesca excepcional, o leitor é surpreendido a cada página não só com o desenrolar da acção, própria dos romances policiais, mas também com o rigor histórico e geográfico em que os acontecimentos se vão sucedendo página a página.
O Último Acto em Lisboa recria de forma admirável todo o envolvimento de Portugal salazarista na Segunda Guerra Mundial, com os fornecimentos de volfrâmio a Adolf Hitler, levando o leitor numa longa viagem pelos sentimentos dos protagonistas que, comprometidos politicamente com os diversos sistemas e regimes, acabam por sacrificar paixões e vontades, atitudes que conduzem a consequências imprevisíveis num Portugal do limiar do século XXI.
Alemanha e Portugal, Hitler e Oliveira Salazar, a II Guerra, o 25 de Abril, a Gestapo e a PIDE, os presos políticos, os métodos de tortura, os judeus e os comunistas, um general assassinado perto de Badajoz, todos desfilam a seu tempo mas perfeitamente encaixados na narrativa, neste magnífico trabalho de Robert Wilson, vencedor do prémio para o melhor romance policial de 1999.
A formidável reviravolta final, que deixa o leitor completamente rendido ao talento deste escritor, nascido em 1957 e que escreve os seus romances numa quinta isolada no nosso país, essa experiência vai você vivê-la. Entretanto, e enquanto não se decide pela obra integral, aqui fica um pequeno excerto:

“… As fachadas amarelas e o arco triunfal do Terreiro do Paço afastaram-nos do rio para o quadriculado da Baixa, entre as colinas do Castelo de S. Jorge e o Bairro Alto. A temperatura ia nos 30.º. Gordas e feias esculturas de bronze mandriavam na praça. O Morgan do advogado cortou pela Rua da Alfândega e virou à esquerda para a Rua da Madalena, que subia a pique antes de descer para a nova versão do Largo de Martim Moniz, com os seus quiosques de aço e vidro e as suas fontes em graça. Contornámos a praça, acelerámos pela ladeira da Rua de S. Lázaro, passámos o Hospital de S. José e entrámos no largo dominado pela fachada de pilares do Instituto de Medicina Legal. Deixámos o carro perto da estátua do Doutor Sousa Martins, em cujo plinto se amontoavam ex-votos de pedra, membros de cera e velas. O Dr. Oliveira já tinha arrumado o carro e descia a colina para o Instituto de Medicina Legal. Carlos tirou o casaco, revelando uma longa tira escura de camisa suada.(…)"


Wilson, Robert – Último Acto em Lisboa, Gradiva, 2000, 2.ª edição;
tradução de Maria Douglas


*Excepto se esse livro fizer parte do espólio da biblioteca de uma velha abadia, cenário de um dos mais famosos romances da segunda metade do séc. XX. Não posso deixar aqui o nome. Não seria justo para quem ainda não leu.

domingo, 20 de janeiro de 2008

O Princípio de Peter


Há mais de 10 anos, um amigo “obrigou-me” a ler um livro que tornou um pouco mais clara a minha percepção da nossa própria modernidade: O Princípio de Peter, escrito por Laurence Johnston Peter (1919–1990) e publicado em 1969.
Atribui-se ao autor a frase "In a hierarchy, every employee tends to rise to his level of incompetence” para explicar esse mesmo princípio:
Numa hierarquia, qualquer funcionário tende a ser promovido até ao seu nível de incompetência.

Pode estar a desperdiçar-se um bom engenheiro.

Distraídos crónicos...


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