segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Quatro ou cinco ideias sem importância


                                                         Foto: António Lopes

                                                                                 1         

Temos o país numa convulsão, ainda sem termos saído daquela provocada pelo vírus que nos alterou mil planos e nos separou, quer temporária, quer definitivamente, de muitos familiares e amigos. Se a crise provocada pela Covid-19 terá sido inevitável, pelo menos é o que se pensa, já esta, provocada pelos políticos portugueses, poderia muito bem ter sido adiada para outra altura, quando o país vivesse uma normalidade mais… normal. Mas não. Os partidos que gerem as nossas vidas (e todos, directa ou indirectamente, gerem as nossas vidas) decidiram que, já que o povo está mais do que habituado a crises, mais uma, menos uma, não teria qualquer importância. O orgulho cego de Costa, a teimosia surda da esquerda e a desorganização total da direita acabaram por ditar este novo caminho que nos há-de deixar ainda mais frágeis dentro das nossas já imensas fragilidades. Além-fronteiras, os outros começam a olhar de revés para nós, um pequeno povo que, ao contrário do que dizia o general romano, gostaria de ser bem governado mas não tem por quem. Aguardemos com serenidade, já que isso é coisa que, desde Abril de 74, não nos vem faltando. E até antes. Até antes.

2 

A direita está a ficar um caco com, pelo menos, dois senhores a quererem ser vizires no lugar do vizir. Rio e Rangel, laranjas até ao tutano, vêm agora para a praça pública lutar por um lugar ao Sol. E quando é que Rangel começou a dar ares da sua graça com maior frequência e intensidade? Quando percebeu que Costa ir cair e que as legislativas antecipadas iam ser mais do que certas. Aliás, se pensarmos melhor, foi Marcelo que lhe fez um claro sinal, quando ameaçou com a dissolução da Assembleia da República se o Orçamento para 2022 foi chumbado. E Rangel, inteligente e atento, percebeu essa sugestão, que de subtil não teve nada, e lançou-se ao ataque. É assim a política, meus caros. Todos almejam os quinze minutos de fama do Andy Warhol. Assim, logo que surge essa possibilidade, não hesitam. Não sei se Rangel dará um bom PM. Não sei se melhor ou pior que RR ou Costa. Sei que o actual boss está cansado e em aparente desistência, mas aberto a qualquer tipo de aliança para garantir o cargo. Não sei se vai ter essa sorte. Ou nós esse azar. Aguardemos, pois.

 

3

O pessoal tem passado os últimos tempos mais à vontade e o mariola do vírus começou outra vez a pôr as antenas de fora, apesar das vacinas, e ainda que a maioria dos portugueses tivesse tido todos os cuidados aconselhados pelas chefias. Começámos a reunir com quantidades consideráveis de amigos e colegas à volta da mesa, a visitar os familiares nos lares e hospitais, a passear por outras cidades, nacionais e estrangeiras, a solo ou em grupo, a participar em eventos culturais com uma descontracção quase… pré-Covid e até com a animação que o regresso à vida normal provoca em seres humanos como nós, de afectos à flor da pele. Como já não podemos abraçar os que partiram nestes tempos conturbados e ingratos, lançamos os braços à volta dos que ainda cá estão, numa tentativa, sei lá, de nos pacificarmos e de, quem sabe, alcançarmos com este gesto os que nunca mais estarão connosco fisicamente. Mas alguém já disse (foi a Directora-Geral) que estamos todos sujeitos a um novo confinamento, se os números de internados e de falecidos continuar a aumentar. Talvez esta responsável pela Saúde o tivesse dito para prevenir ou, tal como Marcelo fez a Costa, para chantagear (quem sabe?) esta gente que já anda aí a espalhar magia como se não houvesse amanhã. Seria bom que não tivessem razão. Porque nós queremos que haja um amanhã e muitos dias depois desse para gozarmos a vida que o Deus de cada um, ou a natureza, no entender de outros, planificou para nós. Lá teremos de aguardar e, enquanto aguardamos, vamos consultando os gráficos da DGS para podermos gerir os nossos próprios comportamentos.

4 

Uma nota breve sobre o segredo de justiça em vigor no nosso país. Esse resguardo em que se embrulham os casos em investigação pelas polícias e pelos magistrados é, como sabemos, do mais frágil que há, um cobertor esfiapado que deixa ver tudo o que lá vai dentro, para alegria de muitos jornalistas e de outros tantos meios de comunicação social. No entanto, nem o Primeiro Ministro nem o Presidente da República, como dois dos representantes mais altos do poder e das instituições nacionais, foram informados dos casos vergonhosos de alegado tráfico de diamantes e drogas por elementos dos comandos do nosso país. Claro: segredo de justiça é segredo de justiça. Ponto.

5 

Na nossa santa terrinha, as coisas vão caminhando sob a égide do executivo recém-eleito, este ainda a usufruir dos planos e iniciativas programadas no tempo anterior. Está, por assim dizer, no fecho das contas. E é o tempo o factor mais importante nisto da política. O tempo e a capacidade de entrega e a vontade indomável de aprender. Se quando a CDU sucedia à CDU, essa transição estava facilitada, precisamente pela permanência das mesmas pessoas, ou quase, nos cargos, agora há que dar tempo, algum, para que a transição se faça de forma segura e transparente. É essa capacidade de partilha, esse respeito e essa lealdade ao povo, que serviram durante mais de quatro décadas, que se espera de uma força política com tanta obra feita no concelho, com tantos pergaminhos e detentora de um passado histórico de luta e de longos e difíceis caminhos percorridos em nome do povo e, sobretudo, dos mais desfavorecidos. Por isso, se pensarmos no actual grupo de trabalho, ainda é cedo para balanços apressados ou para exigências sobrenaturais. No entanto, em breve, todos nós iremos querer saber as diferenças e as semelhanças entre os que foram e os que chegaram à cadeira dos Paços do Concelho desta cidade de santos e heróis. Aguardemos.

 

João Luís Nabo 

In "O Montemorense", Novembro de 2021

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