Francisco
Muito se escreveu
sobre a vinda do Papa Francisco a Portugal e sobre a Jornada Mundial da
Juventude. Já muito se tinha escrito sobre o Papa Francisco e sobre o dedo que
ele começou a pôr nas feridas da Igreja, logo no início do seu pontificado.
Veio, logo que foi eleito, parece-nos, escancarar a porta que João Paulo II
tinha deixado entreaberta. Meio disfarçados até então, os escândalos de
pedofilia no seio da Igreja são assumidos sem meias tintas e condenados por
Bergoglio, que quer justiça para as vítimas e duras penas para os que vierem a
ser condenados.
Mas não foi apenas
com estes casos que o seu tempo na cadeira de Pedro se tem revelado inspirador
e profícuo. A sua forma de entender os evangelhos, reescrevendo-os sempre que se
pronuncia sobre a vida de todos nós, crentes e não crentes, mostra-nos que o
tempo, as leis, as mentalidades no tempo de Cristo, e nos séculos antes da Sua
vinda, não se podem aplicar e serem entendidos da mesma forma, à luz deste
século XXI, que corre vertiginoso ao nosso lado. Francisco transformou o Deus
Todo-Poderoso e vingativo do Antigo Testamento num Pai compreensivo e tolerante
que eu não conheci quando, criança, andava na catequese. O Deus castigador, que,
qual Big Brother de Orwell, andava sempre de olho nas nossas acções, nos
nossos pensamentos e nos nossos desejos, é hoje, nas palavras de Francisco, um
Pai que, como todos os bons pais, aceita todos os seus filhos, por muito
desviados que possam andar dos caminhos que a Igreja decidiu classificar como
os caminhos do Bem.
Se o Papa
Francisco fosse Deus, personalizado e livre de todos os insondáveis mistérios com
que, ao longo dos séculos, os homens da Igreja O cobriram, eu repensaria as
minhas opções de fé e reformularia as minhas vivências espirituais. Mas
enquanto na Igreja não houver uma real e generalizada prática dos ensinamentos
deste verdadeiro homem de Deus… continuarei a admirá-lo, a defendê-lo e a
seguir o seu pensamento… mas do lado de fora.
António e Marcelo
Portugal, esta nossa pátria “muito
amada”, é um país sem rumo e sem políticos capazes de fazerem deste pequeno
território um exemplo perante todos os outros do planeta: a economia está
exponencialmente… a estagnar. As fábricas ficam sem matérias-primas para os
seus produtos. Os combustíveis aumentam, assim como o preço de tudo o que deles
depende: bens alimentares, luz, gás... Os professores continuam a lutar pelos
seus direitos, porque nunca, em tempo algum, no decorrer desta democracia,
trataram tão mal uma das classes profissionais mais importantes e imprescindíveis
à nossa sobrevivência. Os médicos do Serviço Nacional de Saúde continuam mal
pagos e desrespeitados pelas tutelas. Os doentes fazem fila nos centros de
saúde sem saberem se são ou não consultados pelo seu médico de família. As
reformas de grande parte dos portugueses não são suficientes para as despesas
da casa e ainda mais para os medicamentos e outras emergências. Os estudantes
universitários conquistam com o seu esforço um lugar nas universidades mas,
depois, os pais não têm dinheiro para o alojamento e para as propinas. Há
cérebros enormes e utilíssimos ao país que são obrigados a ir embora para
outras paragens onde o seu valor seja verdadeiramente reconhecido. As bolsas e
os financiamentos de projectos de investigação são interrompidos nas
universidades portuguesas sem se saber os motivos. Os montes e vales deste país
estão queimados pelos fogos de Verão, que se repetem anualmente com consequências
gravíssimas para tudo o que é ser vivo. As barragens e as albufeiras, os rios,
os ribeiros, as reservas de água, estão a deixar ver o fundo, com resultados
nefastos para a agricultura, pecuária e consumo humano. Continuam a viver e a dormir
na rua, nas grandes cidades do país, independentemente das estações do ano, centenas
e centenas de sem-abrigo, sem comida, sem dinheiro, sem tecto, sem futuro,
muitos deles vítimas das políticas de habitação e de emprego que atiram para a rua
quem, até então, tinha uma vida digna e razoavelmente feliz. (Põe-se um
Presidente da República a distribuir sopa aos pobrezinhos, como se isso fosse a
solução certa para resolver o problema.) Alimenta-se uma guerra no centro da
Europa, respeitando os protocolos de auxílio e outras cenas impostas pela Nato,
colocando o país à mercê de um míssil mal-parado do senhor Putin, que poderá
atingir, quer a Ponte sobre o Tejo, quer o Castelo de Montemor. Figurões
nacionais fazem figurinhas tristes em cenários de guerra, quando deveriam estar
preocupados com o que se passa no seu próprio país. A extrema-direita
portuguesa continua a ganhar terreno, não devido a mérito próprio mas pelo
demérito da esquerda, que continua dividida e orgulhosa e a permitir que, aos
poucos, tudo regresse ao que estava, enquanto caminhamos vertiginosamente para
o cinquentenário do 25 de Abril.
Tudo isto poderia ser resolvido, com
tempo e com empenho. A questão é que os nossos políticos não têm nem uma coisa
nem outra. Há escândalos nos gabinetes ministeriais, há gatunos à solta, a gozarem
com o Zé Povinho, que já nem sequer tem força para lhes fazer um manguito. Os
ricos aumentam de número e os pobres também. Mais explicações para quê?
Muitos de nós,
patrióticos e amantes deste território que já foi de tantos estrangeiros,
começamos a ficar cansados de sermos portugueses. Sobretudo quando o assunto
nas televisões é, de manhã à noite, o amuo do nosso Primeiro-ministro no
Conselho de Estado.
João Luís Brejo Nabo
In "O Montemorense", Setembro de 2023
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