terça-feira, 11 de outubro de 2022

Horta, Rui: montemorense honorário

 



Há 22 anos, um cavaleiro chegou a esta cidade, vindo de terras longínquas por ele conquistadas. Cidades distantes e enormes: Frankfurt, Zurique, Londres, Montréal, Copenhaga, Tóquio, Berlim, Gent, Nova lorque, Toronto, Moscovo, Lyon, Paris, Munique, Düsseldorf, Genève, Malmö, Gotenburgo, Avignon, Lisboa…

Depois destas e de outras que não cabe aqui enumerar, o cavaleiro ordenou que se tomasse uma pequena cidade ao Sul do Tejo, chamada Montemor-o-Novo. “Montemor-o-Novo, mestre?”, perguntou-lhe um dos cavaleiros. “Montemor-o-Novo será”, respondeu o mestre.

Não trazia cavalo, nem espada, nem armadura, nem se lhe ouviram quaisquer gritos de guerra. O Rui trazia na bagagem a vontade e a paixão e uma colecção infindável de prémios atribuídos pelas mais altas instâncias culturais de muitos países da Europa. Então, quando chegou, subiu discretamente ao monte mais alto, olhou a povoação em volta e disse: “É aqui.” Tomou o castelo sem hesitar e aquartelou-se com as suas tropas fiéis no velho Convento de Nossa Senhora da Saudação e ali, naquele espaço quase esquecido, mas sempre místico, preparou-se para, quero acreditar, a maior conquista da sua vida.

Assim, depois de uns dias de merecido repouso, enviou ao arrabalde o seu pequeno exército que, sob o seu comando, deu início à invasão mais pacífica da História da Humanidade. As instituições, as associações, os grupos, as escolas, as colectividades, as pessoas foram os seus únicos alvos. Posso testemunhar, e vocês também, que todos os edifícios ficaram intactos. E, ao contrário de outros conquistados, que se recusam, por direito, a sê-lo, aqui, nesta terra tranquila, de gente de trabalho, de músicos e poetas, todos se deixaram voluntariamente dominar.

Não resisto em inspirar as próximas linhas num pequeno texto que escrevi, há pouco tempo, para o Rui, sobre o Rui. Consumada a tomada da cidade, mergulhando no ser e no saber deste povo tão extraordinário que é o nosso, Rui Horta e o Espaço do Tempo começaram a confundir-se um com o outro ao longo dos seus 22 anos de existência. Passou a haver, a partir de determinado momento, dois tempos diferentes: Antes do EdT e Depois do EdT. Nesta segunda era, que se prolonga até hoje, as instituições da cidade e do concelho foram amigável e carinhosamente confrontadas com os seus limites através de novos desafios estéticos, técnicos e performativos, que as obrigaram a sair das suas zonas de conforto e a acreditar que, em palco, sob a luz da ribalta, todas podiam ser mais, muito mais, do que a soma dos seus elementos.

A escolha do Convento da Saudação, na nossa cidade, para berço desta instituição, levou a que aquele elemento dominante do nosso património arquitectónico se transformasse num ícone de criação e de liberdade, objectivos exactamente opostos aos promovidos quando da sua construção, no início do século XVI, para albergar um grupo de religiosas dominicanas.  Deliciosas ironias da História.

A partir de agora, novos tempos se aproximam. O Rui deixará a direcção artística do Espaço do Tempo, mas acreditamos que a herança do Homem, do Coreógrafo, do Bailarino, do Artista e do Humanista, irá perdurar e que, sob a nova direcção artística do Pedro, a instituição continuará a abrir portas ao Mundo, à cidade e ao concelho, às suas forças vivas e aos seus habitantes.

            A montra de galardões que o Rui conquistou durante a sua vida ainda não está completa. Falta-lhe aquele prémio que vai receber de todos nós, esta noite. Assumo perante todo este público que não fui instruído ou mandatado por quem quer que seja, mas tenho a certeza absoluta de que posso, sem qualquer receio, e em nome de todos, condecorar o Rui Horta com o mais precioso galardão que nós, montemorenses, lhe podemos atribuir. Assim, em nome de todos e da amizade e do carinho que sentimos por ti, e em recompensa pelas “obras valorosas” que nos ensinaste a amar, e pela revolução cultural que operaste na nossa cidade, e porque Montemor também é a terra da Pia e dos teus filhos, por tudo isto, concedemos-te orgulhosamente o mais alto grau que o nosso coração permite: O GRAU DE MONTEMORENSE HONORÁRIO PARA TODO O SEMPRE!

            Obrigado, Rui!                                                                      

   LÚMEN - Cine-teatro Curvo Semedo, 23 de Setembro de 2022

                                                                                     João Luís Nabo

1 comentário:

Anónimo disse...

Olha que bonito ☺️

Distraídos crónicos...


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